mercredi 11 mai 2011

um pingo de mundo através de olhares diversos, sobretudo, o meu.

O que eu mais ouço depois de lerem textos meus é que eu escrevo do mesmo jeito que eu falo. Assim, ao me lerem, as pessoas, na verdade, me escutam. Ao menos é isso que dá pra tirar desses comentários, n'est-ce pas?
Tava pensando que é pra isso que serve a última flor da lácio, não? O nosso - e somente nosso - português brasileiro.
Acho lindo.
Tudo.
A língua e essas palavras direcionadas a mim que considero não só elogios como reflexos de um dom comunicativo. É. A língua do Caetano. Roçando na de Luís de Camões, mas tão maravilhosamente distinta - sem ofensas aos irmãos lusitanos.
Eu posso me expressar com remarcável desenvoltura em quatro línguas: português, espanhol, inglês e francês.  E Italiano io capisco ma non parlo.  Italiano a vida vai me ensinando aos poucos em diversos cantos do planeta para que eu sempre arranque boas risadas da buona gente que eu encontro correndo o mundo junto comigo.
Já diria o Pessoa: minha pátria é minha língua. A língua materna, no entanto, é - como bem diz o nome - a mãe. E mães, bom, a gente sabe que - raras exceções - são os seres mais lindos com quem a gente divide esse planeta. Que o digam as mother's de Pink Floyd e de John Lennon. 


Nós somos - antes de qualquer outra definição pretensiosa ou não - animais naturalmente comunicativos. Porra, a gente já nasce chorando, querem um exemplo mais expressivo?
E aí? E aí é que tem muita gente maluca nesse mundo que tem que gritar pra ser ouvida. E isso é uma merda. Pra eles e, principalmente, pra nós que escutamos. Escutamos e não entendemos. Não entendendo condenamo-os ao silêncio. Olhem aí o Tiros em columbine revisitado no realengo. Tchê, tem muita gente que mata e morre pra se expressar. Querem exemplo mais emblemático do intragável e, quiçá, infinito mal estar da nossa civilização?

Muita gente, muitos problemas - fantástica definição da nossa era.

Sinto uma pena enorme da juventude extraviada. Uma pena enorme dos Capitães de Areia. Que, diga-se de passagem, apesar de admirá-los muitíssimo (realidade e ficcão) foi um livro deveras traumático. Lido por um pré-adolescente, estudante de uma escola que custava, à época, uns bons e vários salários mínimos mensais. Resumindo, um sortudo filho da elite que ia à Bahia. Mas não àquela Bahia. Ia pra uma muito melhor, uma falsa Bahia ilhada na pequena ilha de Itaparica. Nossa, que chute no estômago. Mas, naquela época, a única comunicação que eu tive com essa realidade foi através do Jorge Amado a quem, aliás, digo obrigado!

Parafraseio o Picasso. O ilustre pablito que, sabiamente, disse que "todas as crianças nascem artistas, o problema é mantermo-nos artistas enquanto crescemos". Agora, sinceramente, lendo isso quem não revirou sua caixa preta a fim de degustar aquelas saborosas memórias da infância quando se era alegremente ingênuo e se vivia num mundo mais colorido e tranquilo. Tipo, literalmente, ganhar comida na boca, quem não sente saudade desses privilégios de uma infância dourada? Que memórias valiosas, não? Concebidos com amor, criados com amor e preparados, com amor, pra um futuro cheio de amor. É lindo. É fácil, na verdade. Complicado, mas fácil. Queria ver o Picasso ter dito essa frase se ele vivesse na terra dos Falcões. Dos meninos do tráfico. Da juventude de balas perdidas. Da vida num estado de exceção no qual o Estado só se faz presente quando os capitães Nascimento sobem o morro cheios de ódios e munição e descem deixando sangue. Muito sangue. Lá, pablito, o problema é crescer. Manter-se artista é impossível porque - raríssimas exceções - nunca se foi durante a infância. Pior: nunca se foi criança.



Através de algumas palavras de Eduardo Galeano, sinto-me culpado por ter um teto, comida e amor nessa vida. Assim, cito o meu genial Vinicius não por expiação, mas por amor. Cito uma das suas obras-primas: O Haver. O grande poeta - nunca o chamarei de poetinha, aliás, ele não gostava desse apelido - falou sobre a "contemporaneidade com o amanhã dos que não tem ontem nem hoje". E, além disso, disse que resta - e enfatizo - nos resta, sim, essa faculdade incoercível de sonhar e de transfigurar a realidade dentro da incapacidade de aceitá-la tal como é. Sem mais comentários. Apenas uma citação com a qual me familiarizei desde que iniciei essa experiência além mar. De esquadros da Adriana Calcanhotto:

Eu ando pelo mundo
Divertindo gente
Chorando ao telefone
E vendo doer a fome
Nos meninos que têm fome…
Já diriam os Beatles: Living is easy with eyes closed. 

Sem falsa modéstia para com a própria alma, então. Talvez seja essa a chave pra uma vida boa e sincera.

Mas vamos dar um pulo à Amsterdam porque lá a vida boa. Há semanas eu estava no topo do mundo. O topo de um mundo ocidental viciado em hipocrisia. Vamos pra lá senão fica tudo muito profundo e, bom, a profundidade de um blog - dessa sorte - a gente meio que sabe qual é. É o intervalo de tempo entre fechar essa janela e (re)abrir o facebook, o e-mail ou o iTunes. Ah o século XXI! Falando nele, um salve de quem agitou afu o começo da década depondo autocracias. Nada mais lindo do que o povo clamando por democracia:



Mas Amsterdam, então. Breve relato que já tinha mais ou menos pronto. Dá pra dizer, sem hipérboles, que, praticamente, em todas as cidades desse mundo maldito se acha drogas e putas. Em Amsterdam, não. Lá, se acha Coffee Shops, Grow Shops, Smart Shops e o Red Light District. Onde as mulheres que trabalham com essa profissão, que já é deveras complicada, não ficam expostas à rua, ao frio e a violência e, além disso, ganham uma grana boa e dão vida a um bairro fascinantemente maluco que, antes da mudança na política de drogas, era o lugar mais barra-pesada e perigoso da cidade. Então, é bem isso. Amsterdam é livre. O problema é que nem todo mundo sabe lidar com essa liberdade.



Eu tive uma experiência mágica com a cidade durante os 6 dias que estive lá. Já ao segundo dia, uma experiência fortíssima e inesquecível: Anne Frank Huis. A casa da Anne Frank. Tomado por toda essa aura da cidade e, absurdamente, feliz de estar lá naquele momento e com aquelas pessoas, a gente foi visitar a humanidade. Sim, quando se entra na casa onde essa guriazinha ficou trancada de1940 a 1945 se vê, imponente, o pôster gigante com quatro fotos dela. Pra mim, naquele momento, ela encarnou toda a humanidade. Eu comecei a chorar que nem um bebê nos primeiros passos da visitação. E, não sei se foi uma viagem minha, mas ela me lembrou muito da minha mãe. Algum traço do rosto dela me pareceu tão parecido e me fez imaginá-la meio mãe, meio Anne Frank livre, leve e solta nas ruas de Petrópolis. Assim, foi ficando tudo mais emocionante misturando saudade da família, das raízes e, sabendo, que é hora de voltar pra casa. Só que não, ainda faltava muito e entrar no universo daquela criança foi um chute no estômago. Não, foi bem mais forte. Aliás, foi bem mais forte que a visita ao campo de ''concentração'' em Dachau, em janeiro. Não sei por qual motivo. Refleti um monte depois. Mas acho que, talvez, seja por que a gente conseguiu banir praticamente todos os campos de extermínio do nosso mundo, mas quantas Annes Frank se escondem dos nossos inúmeros holocaustos revisitados em diversas partes do mundo? Não sei. Também não quero adentrar na seara histórica e socialmente analítica.

Mas acho que é isso, deu pra pegar a idéia, não? A casa em que ela se escondeu fica no bairro Jordaan. Que é o filé mignon de Amsterdam. É o bairro mais afastado dos turistas, mais rico, mais lindo. Nossa, é tão lindo. Lá tu vê os holandeses "de verdade" voando em suas bicicletas ao longo das pontes e dos canais. É um lugar tão mágico, um lugar de uma beleza que emana paz. 
Me lembrou de "A vida dos outros", da sonata de um homem bom, que numa cena o protagonista se pergunta: como alguém que escuta isso pode ser uma pessoa má? O Jordaan me fez perguntar a mesma coisa em relação à ocupação nazista. Como quem tava lá podia disseminar tanto mal? 


É ridículo. É tão triste, mas tão triste, imaginar aquela guria vivendo entre dois andares de uma casa, com todas as janelas cobertas por lençóis pretos, sem poder fazer barulho e, pior, sem poder sair pras ruas dessa cidade tão linda e desse bairro tão encantador. Sem poder se comunicar. Nossa! Aquilo foi me matando. Enquanto os agentes do holocausto tavam na rua, ela tava aprisionada, trancada, escrevendo pra não morrer de tédio e pra não morrer na história. Ela foi capturada dois meses antes da guerra acabar. Dois meses! Que foda...

Pegando os ganchos das citações de Anne Frank e do Pink Floyd finalizo com uma foto. Fotografia. Talvez a arte mais rápida e eficaz em termos de comunicação. Não sei. Sei que Anne Frank foi assassinada em 1945 e que o Pink Floyd fez The Wall em 1979. Mas, vivemos o futuro. Volvemos al futuro. Falemos do nosso século. Quiçá, assunto para um próximo post: MUROS.

Afinal, em 2011, a gente ainda vive isso:


Por quê?

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